De novo no rasto do Lince-ibérico!
Profª Margarida Santos Reis, Centro de Biologia Ambiental da Fac. Ciências de Lisboa
Recentemente têm vindo a público notícias sugerindo que o lince se teria extinguido em Portugal. Porém, uma equipa da Faculdade de Ciências de Lisboa acaba de reencontrar a espécie no nosso País.
Uma equipa do Centro de Biologia Ambiental, unidade de investigação da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, possui agora a prova incontestável de que o lince Ibérico ainda existe em território nacional.
O lince Ibérico (Lynx pardina Temminck, 1824) é o único grande mamífero endémico da Península Ibérica e foi na última década considerado pela União Internacional para a Conservação da Natureza como o felídeo mais ameaçado do mundo (Nowell & Jackson 1996) estando classificado como criticamente em perigo.
Outrora com uma vasta área de distribuição geográfica, tanto em Espanha como em Portugal (Rodriguez e Delibes 1990), no século XX enfrentou o declínio e a área de distribuição foi-se progressivamente restringindo a bolsas populacionais dispersas sobretudo pelo sul da Península com um número estimado de indivíduos muito variável. Pode dizer-se que o lince pagou caro a sua história evolutiva que se traduz numa elevada especialização em termos de habitat (matagal mediterrânico) e presas (o coelho-bravo, Oryctolagus cuniculus) e não se adaptou às novas paisagens geradas pelo homem nem a recursos alimentares alternativos.
As décadas de 40 e 50 foram anos negros para o lince pois sucederam-se as campanhas do trigo, que devastaram vastas áreas de habitat favorável, e a mixomatose, patologia que dizimou as populações de coelho-bravo. Desde então sucederam-se outros desiquilibrios igualmente induzidos pelo homem, como a destruição de outras áreas naturais para plantação de espécies florestais mais rentáveis economicamente (pinheiros e eucaliptos) e a introdução de uma nova patologia (a febre hemorrágica viral) tão drástica para os coelhos como a mixomatose e relativamente à qual tem um efeito cumulativo. Perante este cenário, o lince jamais conseguiu recuperar e nos anos 80 já era notícia a estimativa de apenas 50 indivíduos em território nacional distribuidos de forma desigual pelas áreas da Malcata, Vale do Sado, Contenda-Barrancos e Serras Algarvias (Palma 1980, Castro e Palma 1996).
Apesar deste cenário que já prenunciava uma situação critica para a espécie, apenas nos finais da década de 90 foi assumida a preocupação nacional com a espécie e foi promovida uma avaliação da situação populacional do lince (Programa Liberne – Instituto de Conservação da Natureza). Os resultados dessa avaliação (Ceia et al. 1998), baseada em métodos – inquéritos orais validados e indícios de presença - consensuais no estudo de mamíferos de hábitos elusivos e em situação de baixa densidade (Wilson et al. 1996), vieram confirmar o declínio generalizado da espécie ainda que identificassem outras áreas de ocorrência da espécie para além das já mencionadas (Malcata, São Mamede, Vale do Sado, Vale do Guadiana e Algarve Odemira) e um efectivo populacional dentro do valor proposto por Palma (1980). De ressaltar ainda a estreita ligação de alguns destes núcleos com áreas de ocorrência da espécie em território espanhol (Rodríguez e Delibes 1996).
O lince Ibérico (Lynx pardina Temminck, 1824) é o único grande mamífero endémico da Península Ibérica e foi na última década considerado pela União Internacional para a Conservação da Natureza como o felídeo mais ameaçado do mundo (Nowell & Jackson 1996) estando classificado como criticamente em perigo.
As décadas de 40 e 50 foram anos negros para o lince pois sucederam-se as campanhas do trigo, que devastaram vastas áreas de habitat favorável, e a mixomatose, patologia que dizimou as populações de coelho-bravo. Desde então sucederam-se outros desiquilibrios igualmente induzidos pelo homem, como a destruição de outras áreas naturais para plantação de espécies florestais mais rentáveis economicamente (pinheiros e eucaliptos) e a introdução de uma nova patologia (a febre hemorrágica viral) tão drástica para os coelhos como a mixomatose e relativamente à qual tem um efeito cumulativo. Perante este cenário, o lince jamais conseguiu recuperar e nos anos 80 já era notícia a estimativa de apenas 50 indivíduos em território nacional distribuidos de forma desigual pelas áreas da Malcata, Vale do Sado, Contenda-Barrancos e Serras Algarvias (Palma 1980, Castro e Palma 1996).
Apesar deste cenário que já prenunciava uma situação critica para a espécie, apenas nos finais da década de 90 foi assumida a preocupação nacional com a espécie e foi promovida uma avaliação da situação populacional do lince (Programa Liberne – Instituto de Conservação da Natureza). Os resultados dessa avaliação (Ceia et al. 1998), baseada em métodos – inquéritos orais validados e indícios de presença - consensuais no estudo de mamíferos de hábitos elusivos e em situação de baixa densidade (Wilson et al. 1996), vieram confirmar o declínio generalizado da espécie ainda que identificassem outras áreas de ocorrência da espécie para além das já mencionadas (Malcata, São Mamede, Vale do Sado, Vale do Guadiana e Algarve Odemira) e um efectivo populacional dentro do valor proposto por Palma (1980). De ressaltar ainda a estreita ligação de alguns destes núcleos com áreas de ocorrência da espécie em território espanhol (Rodríguez e Delibes 1996).
Mais recentemente, e na sequência dos avanços tecnológicos no domínio da biologia molecular que permitem a identificação da espécie a partir de ADN extraído de amostras fecais, o Instituto de Conservação da Natureza (ICN) apostou nesta nova metodologia e intensificou a recolha de potenciais excrementos no terreno e a respectiva análise (Pires e Fernandes 2001). Os resultados não foram animadores e suscitaram a necessidade de efectuar uma nova avaliação da situação populacional do lince.
Em 2002, e numa acção concertada com a Direção Geral de Conservação da Natureza em Espanha (Guzmán et al. 2002), o Instituto de Conservação da Natureza dá então início a um novo censo-diagnóstico à escala nacional mas em que se considera apenas como métodos rigorosos a análise positiva de excrementos mediante técnicas moleculares e registos fotográficos (“armadilhagem fotográfica”) não sendo dada qualquer relevância a avistamentos de animais vivos ou mortos e baseados numa descrição rigorosa da espécie. Os resultados preliminares deste censo (Sarmento 2002), que envolveu uma equipa de cerca de meia centena de técnicos e vigilantes do ICN e um esforço de 98 954 horas de amostragem nas áreas previamente identificadas como áreas de lince (Ceia et al. 1998), foram apresentados no decurso do Seminário Internacional sobre o Lince Ibérico, que decorreu em Andújar (Jaén, Espanha) entre 29 e 31 de Outubro, e a conclusão foi de que os “métodos utilizados não detectaram um único lince em Portugal” sendo “altamente improvável que ainda existam indivíduos errantes” (Sá 2003).. Este facto, conduziu à morte anunciada do lince sendo mesmo noticiado que perdemos o rasto do lince Ibérico.
Afirmações como estas levam a que seja assumida, prematura e precipitadamente, a extinção da espécie em território nacional, tanto mais que os métodos empregues para detectar uma espécie em tão baixa densidade e de comportamento tão discreto são condição suficiente para provar a sua presença mas não o contrário. Ignorar outros indícios de presença e observações de animais vivos e mortos por terceiros é um erro com consequências gravosas na estratégia de conservação da espécie.
Trata-se de um projecto de monitorização de mamíferos carnívoros no âmbito do Programa de Minimização para o Património Natural e propôs-se acompanhar as diferentes fases de desenvolvimento do Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva – pré-desmatação, desmatação, enchimento e pós-enchimento – e gerar propostas de minimização de impactes e de gestão ambiental tendo por base a avaliação da situação populacional das diferentes espécies alvo (lince, gato-bravo Felis silvestris, toirão Mustela putorius e lontra Lutra lutra).
Os métodos utilizados para tentar constatar a eventual presença de linces na área de estudo foram a realização de inquéritos orais para localizar avistamentos, a identificação de áreas mais favoráveis em termos de habitat e presas, e a prospecção intensiva do terreno para identificação de indícios de presença, sendo recolhidos para análise molecular os todos os excrementos cujas dimensões e morfologia sugiram que possam ser de indivíduos desta espécie. Dos seis excrementos enviados recentemente para análise molecular no laboratório da Estação Biológica de Doñana (CSIC, Sevilha-Espanha), um revelou-se positivo. Segundo os técnicos do referido laboratório, que se têm responsabilizado pelas análises de ADN de excrementos recolhidos em Espanha e Portugal, incluindo os citados no censo-diagnóstico, a análise foi repetida várias vezes e o resultado foi sempre idêntico – trata-se de um excremento de lince.
Com o presente achado, os esforços de campo desenvolvidos pelos biólogos Joaquim Pedro Ferreira e Iris Pereira numa área de prospecção tão vasta, foram recompensados e é mesmo caso para dizer que foi possível encontrar a agulha que era procurada no palheiro.
O projecto prosseguirá até ao final do corrente ano e a equipa encontrou entretanto outros excrementos que suspeita serem também de lince e que vão de imediato ser enviados para análise molecular. Este resultado positivo vem reforçar outras evidências (pegadas e informações orais) obtidas anteriormente no decurso dos trabalhos e que já apontavam para a ocorrência da espécie na área de estudo (Santos-Reis et al. 2000).
Renasce então a esperança de que ainda vamos a tempo de salvar uma das espécies mais ameaçadas do mundo e mais emblemáticas do nosso património natural, verdadeiro símbolo do matagal mediterrânico. Será que teremos a coragem de enfrentar este desafio e assumir de uma vez por todas as nossas responsabilidades?
Bibliografia
Castro, L. e L. Palma (1996). The current status , distribution and conservation of Iberian lynx in Portugal. . Wildl. Res. 2(1): 179-181.
Ceia, H., L. castro, M. Fernandes e P. Abreu (1998). Lince Ibérico em Portugal. Bases para a sua conservação. Relatório Técnico Final. Programa LIFE. ICN, Lisboa, 190pp.
Guzmán, N., G. Garrote, P. Garcia, R. Pérez de Ayala e M.C. Iglesias (2002). Censo-diagnóstico de las poblaciones de lince Ibérico (Lynx pardinus) en España. 2000-2002. Abstract International Seminar on the Iberian lynx, Andújar – Jaén, Spain (29-31 October 2002).
Nowell, C. e P. Jackson (1996). Wilcats. Status survey and conservation action plan. IUCN/SSC – Cat Specialist Group, Gland, Switzerland, 381pp.
Palma, L. (1980). Sobre a distribuição, ecologia e conservação do lince Ibérico em Portugal. Pp. 569-580 in Actas da I Reunión Ibero-Americana de Zoologia de Vertebrados. La Rábida.
Pires, A.E. e M. Fernandes (2001). Monitorização genética das populações de lince Ibérico.Relatório Técnico (2º Relatório de Progresso), ICN, Lisboa.
Rodríguez, A. e M. Delibes (1990). El lince Ibérico (Lynx pardina) en España. Distribución y problemas de conservación. Collección Técnica, ICONA, Madrid, 116pp.
Sá, A.L. (2003). Um solitário cada vez mais só. National Geographic Portugal. Março 2003.9pp.
Santos-Reis, M., A.T. Cândido, C. Bentes-Grilo, J.P. Ferreira, M.J. Santos, N.M. Pedroso e T. Sales-Luís (2000). Monitorização de carnívoros. Programa de Monitorização do Património Natural de Alqueva. Relatório Final (1ª Fase de Monitorização). Centro de Biologia Ambiental, 39 + anexos.
Sarmento, P. (2002). Status survey of Iberian lynx in Portugal. Abstract International Seminar on the Iberian lynx, Andújar – Jaén, Spain (29-31 October 2002).
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