segunda-feira, 13 de janeiro de 2014
Quando eu era criança, eu vivia tentando pegar peixes com as mãos. Quem já tentou sabe: peixes conseguem fugir tão rápido de quem quer capturá-los que parecem até prever o que vai acontecer.
A agilidade dos peixes, na verdade, tem um segredo bem conhecido: a chamada resposta C-start. Quando o peixe sente uma vibração ou vê algo se proximando de um lado de seu corpo, ele contrai rapidamente os músculos do lado oposto do corpo, fazendo um C, e sai nadando rapidamente após endireitar-se (veja vídeo aqui). Esta resposta é extremamente rápida, demorando cerca de 5 a 6 milisegundos para começar, e ainda garante que o peixe vai fugir para longe do predador.
Se eu não era nenhum pequeno ninja, a ponto de pegar um peixe saudável com as mãos (só houve um episódio trágico com um peixe moribundo), as cobras-de-tentáculos (Erpeton tentaculatum) dão um show de pescaria. Ela geralmente espera suas presas com a cabeça encurvada, formando um J, e fica imóvel nesta posição até um peixe se aproximar, quando ela o ataca rapidamente. Todo este movimento demora de 15 a 20 milisegundos para acontecer, o que seria tempo o bastante para o peixe escapar. Curiosamente, esta cobra consegue capturar uma porcentagem altíssima de peixes.
O segredo da cobra-ninja, caro gafanhoto, só pôde ser desvendado recentemente com a utiização de câmeras de muitos quadors por segundo: a cobra engana o peixe e não o ataca onde ele está, mas sim onde ele vai estar. Por exemplo, quando o peixe se encontra na parte côncava de seu J e paralelo à cabeça da cobra - como na figura abaixo - ela movimenta levemente o seu corpo (números 1 a 3), o suficiente para o peixe perceber e fugir para o lado oposto (4 e 5), que é exatamente onde está posicionada a boca da cobra (6). Ou seja: a cobra faz com que o peixe praticamente nade para o dentro de seu estômago!
Se o peixe está posicionado perpendicularmente à cobra, o processo é um pouco mais trabalhoso: a cabeça da cobra se movimenta para onde o peixe vai estar. De qualquer forma, está explicada a estratégia de ficar em forma de J: é um jeito de se aproveitar de um mecanismo automático do peixe que é altamente adaptativo e esteriotipado.
No vídeo abaixo podemos observar três casos no qual o peixe está paralela à cabeça da cobra e três casos no qual ele está perpendicular. A cobra consegue pegar o peixe 80% das tentativas. Nas 20% restantes, o mecanismo C-start não é iniciado e a cobra erra totalmente a mira (veja ovídeo aqui).
Este é um exemplo inetressantíssimo de como um comportamento esteriotipado abre brechas para ser explorado. Para sorte dos peixes, não parecem ser muitos os predadores que usam esta estratégia.
Referências
Eric D. Tytell and George V. Lauder (2002). The C-start escape response of Polypterus senegalus: bilateral muscle activity and variation during stage 1 and 2 The Journal of Experimental Biology, 205, 2591-2603
Catania, K. (2009). Tentacled snakes turn C-starts to their advantage and predict future prey behavior Proceedings of the National Academy of Sciences DOI: 10.1073/pnas.0905183106
Imagens: J Exp Biol (C-shape),Ryan Somma (foto da cobra, FLICKR) e PNAS (esquemas da cobra e peixes).
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário